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O dia 9 de outubro foi sangrento.

Tudo começou quando fomos informados no trabalho que nosso camarada Hidalgo, o historiador fidalgo, faria uma cirurgia e precisava de quatro doadores de sangue. Eu e mais três colegas prontamente nos oferecemos para esta jornada, que iníciava em Nova Iguaçu-RJ e terminava na Gávea, bairro da Zona Sul da Cidade do Rio de Janeiro.

Quem é do Rio já perebeu só de ler o parágrafo acima quem seria o grande inimigo desta diligência: o trânsito. Como não era tarefa minha dirigir o carro, encontrei meu próprio modo de  ludibriar o vilão; maior parte do tempo que gastamos pulando de uma via engarrafada para outra eu passei dormindo.

Chegando próximo a nosso destino eu “acordei” e me deparei com uma turma meio perdida; nenhum de nós conhecia bem a área, e o trânsito mais uma vez não colaborava. Quem nos salvou foi o gps do meu celular, que nos guiou ao local correto indicando distância, tempo de percurso e melhores caminhos.

A coleta em si foi bem rápida, em pouco mais de meia hora estava tudo resolvido. A maquininha encheu uma bolsa com o meu  sangue, cuja perda logo comecei a repor atacando o sanduíche com suco que me deram na cantina ao lado. Finda a tarefa, me vi com o resto do dia livre; ao doar sangue o trabalhador fica, por lei, dispensado do serviço para o resto do dia.

Estávamos nos últimos dias do Festival do Rio, e o Shopping da Gávea, que participa do festival, fica bem atrás do hospital. Me despedi da turma e fui sozinho ao shopping conferir o que estava em cartaz. Aproveitei e dei uma passada no Bob’s para repor os níveis sanguíneios de mostarda e ketchup.

Os filmes no cinema do shopping não me interessaram tanto, mas eu peguei uma revista do evento com todas as sinopses e endereço dos estabelecimentos participantes. Dentre o que estava disponível, decidi assistir Fog – A Bruma Assassina (John Carpenter, 1980), que estava em cartaz no Centro Cultural Banco do Brasil.

Para chegar lá peguei um ônibus que para um turista teria sido um sonho, ele fez “excursão” por todos os bairros da Zona Sul, me deixando em nossa velha conhecida Praça XV onde, entre outras coisas, se localiza o CCBB.

Antes do filme problemas de sistema que impediam a venda de ingressos causaram uma pequena espera. Aproveitei a oportunidade para enriquecer a composição de meu sangue com refrigerante e conhecer a lojinha de suvenires local. Resolvido o problema, paguei meus R$6,00 e fui para a sala.

Quem recolhia os ingressos era um homem de terno e gravata que também assistia a exibição numa cadeira destacada, tipo um lanterninha, só que mais bem vestido. Me pergunto quanto um indivíduo desses deve ganhar e se é trabalho concursado. Eu prestaria concurso para trabalhar assistindo filmes e ainda andar na rua com pinta de businessman.

A sala tem capacidade para 100 pessoas. Um número razoável de espectadores compareceu, umas quinze a vinte pessoas. Destaque para uma senhora muito idosa, provavelmente mais de noventa anos; me pergunto se ela sabia o que estava prestes a assistir. Será que a vovó curte mesmo filmes sanguinolentos? Acho que nunca saberei.

Sou fã do trabalho de John Carpenter, e seu O Enigma do Outro Mundo (The Thing, 1982) foi meu filme favorito por muitos anos, e deve ter sido o que mais vezes assisti na vida. Também gostei muito de Eles Vivem (They Live, 1988), Aventureiros do Bairro Proibido (Big Trouble in Little China, 1986) e Fuga de Nova York (Escape from New York, 1981). O diretor também é conhecido por Halloween (Idem, 1978).

Bruma Assassina não é um dos melhores filmes de Carpenter, mas não deixa de ser interessante. No começo pareceu que ia ser chato, mas foi melhorando e, perto do clímax, prendeu bem a atenção. Pena ser um daqueles filmes com “final surpresa” forçado. Acredito que era moda na época, uma quebra do paradigma do “final feliz” que imperava antes. Pelo que soube o diretor, após terminado o filme, ficou insatisfeito com o resultado final e refilmou um terço da película, alterando a história e incluíndo mais sangue.

O ponto fraco ficou mais pela cópia do filme utilizada, cheia de defeitos e até com pedaços (de segundos, espero) do filme perdidos. A letra da legenda também era bem ruim. Me pergunto se era um original que ficou mofando por mais de trinta anos e foi desencalhado por conta do festival.

Após o filme peguei um ônibus para casa na Praça XV mesmo, o que concluiu mais uma aventura e mais um festival. Espero participar mais de sua versão 2013, quem sabe não aproveito e combino com outra doação de sangue?